segunda-feira, 15 de agosto de 2022

NOTA DE URGÊNCIA: SÍTIO ARQUEOLÓGICO DESCOBERTO EM RUA CENTRAL MOVIMENTADA DE ANGRA DOS REIS É DESCARACTERIZADO.

1- Contextualização dos fatos:

Por volta das 11h do presente dia de 15 de agosto de 2022, na rua Pereira Peixoto, nas coordenadas -23.008452,-44.318685 , lateral esquerda da Praça Silvestre Travassos, dita Praça da Igreja Nsa. Sra. da Imaculada Conceição , operários da CEDAE(estadual) em serviço de águas, deram com ossadas, porcelanas e demais vestígios arqueológicos.



O Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica de Angra dos Reis- IPHAR, por seu representante, em conformidade do seu Estatuto, aprovada a Nota em conjunto, se pronuncia no que tange a  imagens amplamente divulgadas, da página Angra da Deprê ( https://fb.watch/eWlHFmQaIM/) da plataforma de mídia virtual Facebook,  baseados na legislação pertinente e na práxis científica forense, vem a público informar:


2-Do procedimento flagrado e da orientação exigida:

Há uma pessoa sem uniforme, recolhendo os objetos aflorados e escavados acidentalmente, informações chegaram que se trata da Diretora ou funcionária da Secretaria Municipal de Cultura, em seu Departamento de Patrimônio Cultural. A ação é indevida.

Como notório conhecimento por nossa experiência, que a Prefeitura de Angra dos Reis não tem profissional técnico qualificado, ainda que de boa vontade,  para manuseio, fazer prospecção de terreno e nem meios de acondicionamento, tendo em vista que o próprio Museu de Arte Sacra , até o momento sequer tem um plano de emergência , nem equipamentos e nem instalação de alarme e combate automático de incêndio, orientamos que deveriam ter isolado a área , interrompido o serviço e acionada a autoridade federal, no caso, o IPHAN.

A pesquisa forense e o devido laudo arqueológico são exigências.





3- Da legislação

A Constituição Federal vem exprimir:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

(...)

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

(...)

§ 4º Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma da lei.

Já a legislação federal temática adstrita,  tem fundamentação básica em dois parâmetros:o Decreto-Lei 025/37 e a Lei 3924/61.

No caso, como o citado Decreto- Lei 25/37 se refere mais ao conceito e normativa de tombamento legal, vamos especificar a Lei 3924/61.

Citamos:

Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos.


     Art. 1º Os monumentos arqueológicos ou pré-históricos de qualquer natureza existentes no território nacional e todos os elementos que nêles se encontram ficam sob a guarda e proteção do Poder Público, de acordo com o que estabelece o art. 175 da Constituição Federal.

      Parágrafo único. A propriedade da superfície, regida pelo direito comum, não inclui a das jazidas arqueológicas ou pré-históricas, nem a dos objetos nelas incorporados na forma do art. 152 da mesma Constituição.

     Art. 2º Consideram-se monumentos arqueológicos ou pré-históricos: 

a)

as jazidas de qualquer natureza, origem ou finalidade, que representem testemunhos de cultura dos paleoameríndios do Brasil, tais como sambaquis, montes artificiais ou tesos, poços sepulcrais, jazigos, aterrados, estearias e quaisquer outras não espeficadas aqui, mas de significado idêntico a juízo da autoridade competente.

 

 

c)

os sítios identificados como cemitérios, sepulturas ou locais de pouso prolongado ou de aldeiamento,

4-Histórico

Em 2008, durante as obras de reurbanização tocadas pela Prefeitura, operários estavam escavando em frente a Igreja de Santa Luzia (século XVII) e encontraram fortuitamente ossadas, objetos , tecidos e outros materiais orgânicos e  artificiais, que com características sepulcrais, estavam no adro da igreja, cujo local sagrado para a religião cristã, detém historicamente féretros , costume que vigorou até o século XIX no Brasil, que, devido a insalubridade, houve a promulgação de interdito legal com a Carta Régia n°14 de 1801, teve a lei de 1825 , depois a chamada lei salubre de 1828 e finalmente em 1850.

Uma pessoa conhecida, de família sem tradição secular, mas com negócios no município, colheu em caixa de papelão, levou a Câmara de Vereadores (não se sabe a finalidade) e de lá desapareceram os achados históricos...

Quando chegamos na Câmara, já não havia indícios.

Em 2018, em nossas investigações , conseguimos rastrear no Museu Nacional algumas peças provenientes de Angra dos Reis-RJ; com a parceria de uma arqueóloga lotada naquela instituição, estávamos prestes a fazer uma incursão , quando o incêndio destruiu parte da Reserva Técnica e arquivos.



Assim, por final, citamos a Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural(ONU,1972):

 


5-Orientação final:

5.1-Isolar o local.

5.2- Não remover, manusear ou escavar o sítio.

5.3-Acionar a CEDAE no seu preposto mais imediato .

5.4-Acionar o IPHAN.


São nossas preocupações e orientações no momento.

Carlos Eduardo da Silva

Prof.Lic.

Presidente

Angra dos Reis, 15 de agosto 2022

Assinam junto:

Maria Célia Costa-Vice-Presidência

Maria do Carmo Firmiano-Secretaria Geral

Valnei Albino-Dep.de Pesquisa Antropológica da Cultura Caiçara, Quilombola e Indígena (DEACQI)








 

domingo, 7 de agosto de 2022

EXPEDIÇÃO TÉCNICA BÂNAN-Y 2: ESTRADA HISTÓRICA NUNCA ANTES PESQUISADA!.:

 1- Objetivos:

Inicialmente o subprojeto aqui apresentado era apenas cadastrar e fazer o levantamento historiográfico de  um trecho escolhido do pavimento, tanto como amostragem da tecnologia do construtor, quanto da contextualização frente aos outros Caminhos e Estradas Históricos que já estão dentro do Projeto Estradas Antigas, Caminhos do Coração. Assim procedemos. Chegamos no quadrante  -22.752987 -44.322091(aprox.), e coletamos dados de volumetria, tomada de fotos, cálculo médio das peças do pavimento e estudos de caracterização arquitetônica.

1.2-Oralidade, esquecimento e lendas.

Após quase 200 anos aproximadamente, esta estrada imperial, está ainda imersa em lendas e conhecimentos esparsos. O ritmo acelerado de terabytes, megapixels, criptomoedas, das telas brilhantes e ao mesmo tempo do ressurgimento aleatório de ideologias grotescas e instintos mais primitivos na nossa sociedade contemporânea, fazem esses sítios arqueológicos ficarem abandonados; quisera eu que ficassem estáticos, como numa cápsula do tempo.Mas não estão: riscos iminentes de retirada de pedras, desbarrancamentos naturais por excesso de chuva, gado fazendo sulcos profundos, favelizacões são ameaças a esses patrimônios materiais edificados.

Os próprios bananalenses (e tantos outros brasileiros) onde há ocorrência desses caminhos tem ouvido falar por décadas da existência da calçada de pedra, ou estrada da calçada, como os locais denominam esta imensa odisséia construtiva e humana, que foi a ereção dessa via.

Um parente antigo, um mateiro, um tio... eram as únicas testemunhas da existência daquele monumento. 

E nós, em parceria e amizade com os próprios moradores e proprietários conscientes e suas autorizações, descortinamos e publicizamos de forma inédita, com rigor científico mínimo, mais uma etapa do nosso Projeto  Estradas Antigas, Caminhos do Coração.

Uma pesquisa in loco, com objetivos acadêmicos e culturais, nunca foi feita especificamente sobre esses caminhos, em seu conjunto orgânico-espacial da malha viária geral. Nós somos os descobridores de vários trechos .



 

Havia um verdadeiro circuito, como hoje,
 de estradas e caminhos.



Ilhas de araucária



2-Caracterização geomorfológica

A região está no Vale aluvial do Rio Turvo, na região do Brandão.

São campos de altitude, inclusive com presença de Araucária angustifolia, porém, ecologicamente falando, em pequenas ilhas existenciais e tem o chamado mar de morros, formação geológica de montes de peque e média altitude, em cujos cumes e pequenos vales de riachos são mantidas manchas de mata.

Há lajes e matacões graníticos por toda área.

Descrição anatômica de partes
da 
Araucaria angustifolia 
por Siebold & Zuccarini,
 em 
Flora Japonica, 1870







3- Contextualização socio-econômica

Acostumados a lidar com tropeiros, caçadores e toda sorte de passantes, por mais de 400 anos, os moradores são acolhedores, tem caráter firme e sempre tem soluções estratégicas para o meio natural e os desafios antropológicos.

A agência Bocaine-Se Turismo e Aventura,
 do Joaquim Leonardo da Silva Valim,
 foi que nos levou.
Tivemos ainda o Gil Fonseca e o Paulinho..

A necessidade das prioridades rurais de transitar para comércio de leite principalmente, está causando a retirada proposital do calçamento ancestral. Versão duvidosa dos nativos, é que as pedras podem soltar e causar prejuízos mecânicos e acidentes, porém, eles retiram a pavimentação e deixam no barro cru, o que, contraditóriamente, nas primeiras épocas de chuva, transformarão a estrada rural em atoleiro.




Rancho-curral

Fazenda da região.

No sítio do Paulo Andrade, Paulinho,
 temos resquícios construtivos
 em estilística canjicado em pedra seca.

Trecho inicial

A garganta ao fundo.


Pirâmide


4-Um caso especial: o pouso 

Após o primeiro trecho de curvas sulcadas artificialmente (nível), encontramos um platô medindo aproximadamente 100 x 100, onde existe ainda uma casa caipira, abandonada, porém de tamanho e repartições considerável, atualmente de propriedade do Sr. Antônio, irmão do Paulinho, já citado.

Fazendo uma análise do terreno, das paredes e da ambientação geral, verifiquei que ala casa atual está sobre uma outra fundação, de pedra, inclusive usando parte dos muros antigos.

Esse platô, tem características de importância que sobressai a mera moradia rual de subsistência: tem água, enorme espaço plano e fica exatamente no último trecho de cortes da estrada (2°, de quem sobe do Turvo) antes da virada para o planalto do Pirahy (no caso, um afluente pequeno, o Córrego do Bacalhau), já bem depois da vertente.

Oralidade atestam ter sido uma casa senhorial mais antiga de uma família de Bananal-SP.

Terá sido ainda anteriormente um pouso ?

Típico tesouramento rural caipira

Mescla de épocas

Fundação

O telhado segue em harmonia com o relevo.

Visão de todo a Estrada, do platô

5- Ampliação do espaço excursionado.

A equipe decidiu continuar a Expedição e foi identificando os elementos marcantes da paisagem, como a rocha pirâmide ( -22.764786,-44.312567) o rancho-curral e o trecho das curvas de nível artificiais especificamente da Estrada, em -22,7668188, -44,3145400 aproximadamente.

Chegamos a 1300m de altitude.

Ali constatamos vários traços do calçamento original , porém, com várias marcas de erosão e deslocamento natural de massas.

Trecho inicial


Formação geológica pirâmide


Traçado original

Arrimo?

Cinta

6-Tipificação:

O conceito aplicado para a construção ainda está indefinido, assim decidido pelo chefe da missão, pois ao contrário de outros caminhos antigos e estradas históricas estudados, no trecho percorrido até a vertente da Bocaina, o pavimento está bastante introjetado no solo e recoberto de gramíneas. Em amostras que registramos, tendencia para o estilo moldura, mas em nossas novas incursões, faremos o diagnóstico definitivo.

Na Expedição Caminho da Pedra/João Oliveira, detectamos formas mistas de desenhos na engenharia.

Clique aqui e conheça a Expedição Caminho da Pedra/João de Oliveira

cinta

Peças grandes

Profundidade


Arrimo?


cinta ou faixa

Mapa com as redes de estradas:IPHAR


Desenho ilustrativo, de ambiente real,
de Agnes Ethel a partir de visita in loco
 no bairro Zungu,Angra dos Reis-RJ,
na Expedição Caminho
da Pedra/João Oliveira.

Caminho da Pedra, Angra.
As curvas de nível em direção
 a garganta da Macieira.

 
Colorização para facilitar.

Nas Cartas Topographicas da Capitania do Rio de Janeiro, de Vieira Leão, de 1767, temos a presença do Caminho do Caramujo, mas não a estrada da Pedra/João Oliveira/Ramos, pois eram meras trilhas, porém, havia já alguns calçamentos esparsos em brejos, lodaçais e rios...em poucos caminhos do século XVIII.

A equipe constatou a mesma inovação
para a época do da Estrada
 da Pedra/João Oliveira:
canaletas de rocha maciça,
para drenagem pluvial.

No cume, dita vertente, antes de descer
para o planalto do Pirahy, o calçamento continua,
porém, sem erosão devido a floresta.

Montagem , com fotografias reais
de reprodução da indumentária que fazemos.

A obra é do século XIX, porém, o desprimor pode ser indício de sobreposição de outras épocas e métodos de montagem ou até diversas reformas. Deixamos aberta a comprovar, maior dilatação cronológica, pois trata-se de rota de uso citado inclusive ulterior ao ciclo aurífero (ABREU, João Capistrano de. Capitulos de Historia Colonial. Caminhos antigos e o povoamento no Brasil. Brasilia: UnB, 1982 e Sales, Cristiano Lima  Ref: f. 309-323.)

Moeda do século XVIII

Moeda do séc. XIX,
 que circulava na época do apogeu
 da Estrada da Pedra (nosso acervo)

Testemunho documental de que havia intenso tráfego de tropas com centenas de muares e bovinos, além de caixeiros viajantes e contingentes de escravizados para fazendas da região, são as Atas da Câmara de Vereadores de Bananal-SP, onde se lê, no jornal periódico:



Outro documento importante é a citação em outro periódico, com pedidos de manutenção:






Portanto, nessas publicações de 1835, se vê alguns aspectos e tiramos alguns direcionamentos:

1-A importância econômica e social da ligação Jurumirim x Bananal e outros portos citados.

 (A 2° cidade mais movimentada do Brasil , fora a Corte/Rio, citando Laemmert, in Vasconcellos, Maria Cristina Roma, Famílias escravas em Angra dos Reis, 1801-1888 - ABPHE)

2- A cotização entre os capitalistas imperiais da região para que o fluxo comercial fosse continuado.

3-A presença estatal com um Registro.

4-Que cada bairro grande, sedes de Distrito de Angra dos Reis-RJ, a partir da Japuiba, como o atual Ariró, Bracuhy, Frade, Mambucaba...tinham seu próprio e movimentado porto!

5-Tal como teorizamos há anos, o Caminho (Estrada) da Pedra tinha interligação direta com o nosso descoberto Caminho do Caramujo.

Clique aqui, e conheça o Caminho do Caramujo, descoberta inédita do nosso grupo

Tecle aqui e conheça a visitação trazida por nós, de arqueólogos e historiadores ao inédito Caminho do Caramujo

7-As peças do estrado lítico

Talvez pela abundância de material rochoso e portanto a possibilidade de oficinas de mineração próximas para a confecção do piso, o calcetamento robusto usou indivíduos com apenas o lado externo ao arruamento, lavrado grosseiramente, sem muito critério de seleção, porém de grande porte: a média dos espécimes tem variação entre de 1,1m de comprimento x 0,80m de largo, com profundidade de 0,15m., sendo as maiores de cinta estabilizadora nas laterais da rua.

A largura da estrada é de 4m até a vertente.

Resplendor do altar
da Igreja de Nsa. Sra. dá Lapa,
do Ariró, Angra dos Reis-RJ.

8- Conclusões (transitórias).

A trajetória que percorremos e a análise temporal e material indicam ser do século XIX, mas há indícios de maior antiguidade.

A Expedição Bãnan-y 3 será o marco para a interligação lógica de entendimento das ramificações tanto físicas quanto culturais.

Carlos Eduardo da Silva

Prof.Lic.Hs.

Bananal-SP, 30/07/22