quarta-feira, 3 de setembro de 2025

EXPEDIÇÃO TÉCNICA ARUNDÚ: INÉDITO REGISTRO DA TRILHA DOS TROPEIROS

1- Início e preparação.

A odisséia de singlar as escarpas íngremes da Mata Atlântica e passar por horas no cume da rede de montanhas do Sinfrônio exigiu um mês de preparativos . Incluindo uma reunião prévia na casa do morador Luiz do Pastel, com alguns nativos experientes, para um debate da situação atualizada do percurso.

Assim, o mateiro experiente e guia local, Vagner, que inclusive mora ao lado da Estrada histórica, ficou prontificado a ajudar.

Nosso guia, Vagner.

Percorrendo cerca de 26 km entre o bairro Belém (Angra dos Reis-RJ) e Lídice (Rio Claro-RJ) em meio a floresta ombrófila densa e matas de altitude(já no Sertão do Sinfrônio ). Trata-se de antiquissima rota entre Angra e Lídice. 
















🛖Desde a época dos indígenas (séc.XVI) , depois dos escravizados (séc.XVII-XIX) e dos tropeiros e carvoeiros (séc.XX).


1.1-Introdução: origem e nomenclatura da Expedição

🥾O nome Sinfrônio tem origem grega, derivado de "Synphrónios" (Συμφρόνιος). 

O significado mais aceito é " aquele que pensa em conjunto". O nome está relacionado à ideia de alguém que busca a harmonia e o entendimento mútuo.

É costume do IPHAR dar nomes indígenas as Expedições. Assim, Sinfrônio virou seu homônimo no léxico Tupi: ARUNDÚ, que quer dizer "pensar junto, mesma opinião". Ou seja, mesmo objetivo.


3- Oralidades e  andanças anteriores

Guiados no bairro pelo amigo Júnior, o ponto de encontro foi na margem da BR101 , em frente a loja EletroRio. Dali passamos em frente a antiga igreja católica, hoje abandonada e sendo do século XIX , ali fiz uma pequena explanação sobre sua história. Na entrada da estrada histórica o guia nativo Vagner já estava a nossa espera. Após a estrada férrea, começa o chamado Caminho do Sinfrônio, que na verdade até certo ponto, ainda percorre um trecho da estrada de pedra antiga. Após, tem uma bifurcação, que , subindo, já de fato inicia o Caminho do Sinfrônio , picada milenar pré-cabralina percorrida por indígenas Tamoios em comunicação com o Vale do Rio Parahyba, com outras etnias, como os Puris.

Um dos narradores aventureiros que percorreram a região , foi Anthony Knivet, um inglês que foi escravizado pela família De Sá e que fugindo, passou pela região de Angra dos Reis e Ilha Grande, subindo as florestas até o Vale do Parahyba algumas vezes.

A posteriori, já no século XVIII ao XIX , picadas se transformaram em estradas onde contingentes enormes de sofridos escravizados subiam a selva, acorrentados nos ditos conductas dos portugueses e ou libambos, como eram conhecidos na África, após engordarem na Fazenda Japuhyba, pós desembarque na praia em frente, hoje um manguezal.



No meio do século XIX até 1950 aproximadamente , vigorou nessas paragens montanhosas, a cultura cafeeira e depois carvoeira, e as subidas e descidas constantes passaram a ser feitas por tropas , de muares e equinos , com cargas pesadas tanto para exportar pelos portos angrenses , quanto para alimentar a indústria siderúrgica e as ferrovias do Vale do Parahyba.


Recentemente, nos anos 1990 e 2000, poucos se aventuram na rota, como motoqueiros e cavaleiros, se tornando desde então objeto de lendas e desconhecimento real .


3.1- Metodologia: Divisão da rota.

Como forma didática, dividimos o percurso em 3 partes, o de cada trecho tem marcadores antrópicos e geológicos próprios.

O primeiro trecho, começa na igreja católica do século XIX, marco antropológico e social da área, passando pela bifurcação entre a descida para o Vale da Banqueta e o início da Estrada Histórica e subindo ate a ferrovia, passando pela Estação Jussaral e até uma cisterna de pedra. 

O segundo trecho segue da cisterna, passa pela bifurcação da Estrada Histórica e sobe região íngreme , passando por longo caminho nos cocurutos da cadeia montanhosa até uma formação geológica alta , triangular, de gnaisse e granituca, denominada localmente por "Pedra Pingadeira".

O terceiro segmento segue após a Pedra Pingadeira e vai até a Cachoeira da Carmem, já descendo o Vale do Sertão do Sinfrônio.


3.2 Início do registro e mapeamento

A mata é basicamente secundária na maior parte do circuito, com poucos espécimes árboreos  de grande circunferência, nas cercanias da altimetria 600m, mas já nos topos de morros, atingindo 1200m, já avistamos árvores mais robustas. O trajeto é cansativo, porém a brigado, sendo todo em sombra, e com piso firme,  poucos enraizamentos entrelaçados e alguns pequenos córregos e sobressaltos de pedra. 


4- A Pedra Pingadeira e o Sertão do Sinfrônio .

A Pingadeira é uma formação geológica com aproximadamente 100m de altura , tratando -se na verdade de um maciço rochoso de tipologia geológica granítica, de onde permanentemente caem esguichos leves de umidade da vegetação , daí o nome Pingadeira.





Dali se percorre vales de pouco declividade com vários ribeirões, até se chegar na área mais descansada e com vários sítios e moradias, onde fica a Cachoeira da Carmem. Aliás, uma região idilica, com resquícios de muros de pedra, uma singela capela cercada de pinheiros e araucárias...formando um conjunto paisagístico único, inclusive quase sempre com a presença de brumas de cerracão.







5- Um marco no montanhismo e a reafirmação de amizade com a comunidade local .

Entrevistei moradores sitiantes e curiosamente os documentos descrevem "estrada velha da Japuiba". Correlacionando com nossa tese pioneira, de que a estrada fora construída especialmente para o fluxo da Fazenda Japuhyba.

🟡Década de 1990:
 ainda havia resquícios
de possível cais .
🔴Fazenda Japuhyba:
possível fazenda
de engorda /leilão.

E estamos falando de uma trilha inóspita, sertaneja, de mata fechada,  com 1209m de altura. Também visitamos rapidamente nossos amigos quilombolas. Além de participarmos da Festa de Peão e encontro de cavaleiros no Rio das Pedras, na Cachoeira do Bastião Marinho.

 💚Essa trilha nunca tinha sido mapeada!

É um novo circuito !

O IPHAR, com importante participação do grupo Trilhos e Trilhas,  abriu um marco na história do montanhismo da Costa Verde e do Estado do RJ!

As pesquisas de campo continuam.























quinta-feira, 7 de agosto de 2025

CUNHA-SP, DOS TROPEIROS A CERÂMICA: CONHEÇA AS CARACTERÍSTICAS DA ARTE ORIGINAL CAIPIRA.*

🏺 1-Atualidade

Desde a chegada dos primeiros ceramistas comerciais, em 1975, japoneses , um português e um brasileiro, Cunha se tornou uma grande exportadora de peças artísticas de cerâmica.

A técnica oriental do noborigama é a mais usada.

Cerâmica em Cunha-SP

🏺2- Desde sempre, terra dos moleiros.

Porém, a cerâmica em fornos de chão e lenha, das paneleiras típicas , senhoras da cultura caipira com suas fôrmas manuais já existia na região. Algumas maneiras de fazer as peças, que eram basicamente utilitárias como panelas, baixelas, etc e origem pré cabralina , ou seja,  dos indígenas Tapuias e depois aperfeiçoada pelos artistas barrocos santeiros, que além dos maneirismos típicos europeizados, também tiveram influência andina.


Checar em MANA 25(3): 701-742, 2019 – DOI http://dx.doi.org/10.1590/1678-49442019v25n3p701


Checar em MANA 25(3): 701-742, 2019 – DOI http://dx.doi.org/10.1590/1678-49442019v25n3p701


Portanto, em bairros rurais , o visitante encontra a originalidade dos ancestrais que passaram de modo empírico e oralmente o trejeito de usar a terra , o caulim e os minerais.


 🏺3-Exemplo :

No exemplo a seguir imagens), nosso acervo derem uma dessas peças de técnica caipira.

É o artista cunhense Messias. Que também é o grande ajudador dos outros moleiros, retirando a argila .





Trata-se de uma cumbuca , com marcas de mescla em belos tons ferrosos, decorrentes da queima e mistura de cinzas. Também percebemos o micro brilho dos cristais de silicato e quartzos, resultante da emulsão da massa original, trazendo um efeito constelatório/estelar de fundo. O formato, é talvez o mais primitivo modelo escultórico , usado pelos povos originários milenares.

sábado, 2 de agosto de 2025

.IPHAR ENTRA PARA A CÂMARA TEMÁTICA DA APAMan , FAZ VISITA TÉCNICA AS RUINAS E COMPÕE GRUPO DE FORMAÇÃO PARA CRIAÇÃO DO GEOPARQUE COSTA VERDE.:VISITA A SÍTIO HISTÓRICO DO PARQUE CUNHAMBEBE RESULTA EM RECONSTITUIÇÃO PELO IPHAR*


1- Reunião do Conselho

No dia 28/06  o Pres.Eduardo e o arquiteto colaborador do IPHAR, Gil Fonseca estiveram na reunião da Câmara Temática sobre a APAMan (Área de Proteção Ambiental de Mangaratiba), dentro da sede do Parque Estadual Cunhambebe (PEC), nossa querida Unidade de Conservação estadual que abrange Angra, Rio Claro, Mangaratiba e Itaguaí.



O convite foi feito pela excelentíssima professora Sandra, grande incentivadora do Conselho daquela unidade.

Como expertise no assunto patrimonial, também estamos entrando como membros da comissão de formação do futuro Geoparque Costa Verde, iniciativa rica em conhecimento científico, turístico e em prol da população regional, fomentando geração de renda.


2-Visita técnica e reconstituição 

Após nossa visita a sede do PEC para a reunião do Conselho daquela Unidade de Conservação e como sequência a ida a Trilha Curumim, o presidente do Instituto, o historiador,  Prof.Lic. Carlos Eduardo junto com arquiteto Gil já supracitado, acompanhados de duas guardas-parques e o guia de turismo Edson, nosso Instituto, dentro da sua expertise de 30 anos, finalmente vem a público apresentar o resultado da análise arquitetônica, do fluxo antropológico e de outros fatores atinentes: lhes apresento a reconstituição provável (ainda preliminar) do casarão do sítio arqueo-histórico  Curumim.


3-Relatório Historiográfico

Após as medições da área edificada e do entorno  (a terraça e seu muro de arrimo), iniciamos a análise arquitetônica e o fluxo antropológico .


3.1- Descritivo 

O conjunto arquitetônico do casario em planta em losango e de ruínas de um cômodo externo, com apenas as fundações deste,  somado ao extenso pátio artificial com amarração por mureta de aproximadamente 0,80 cm de altura e em torno de 100m de comprimento linear, formam um perímetro de 2600 m .

O imóvel apresenta uma escada em L frontal e é dividido em dois andares , até onde conseguimos vislumbrar pela altura das colunas . Possui andar térreo ou porão (mas a configuração do pé direito não indica senzala ) e um andar superior.



Ao centro da edificação, como divisionando a contrução em duas, que por sinal tem dois níveis, que denominaremos nível 1 (abaixo) e nível 2 (acima), há uma espécie de rampa que ligaria o térreo ao primeiro andar e 1° nível do terreno. Tal rampa mede 2,5-3m. Essa estrutura de acessibilidade, seria indício de volumosa movimentação de carga ou contingente humano.



O método construtivo das paredes e a posição dos seus elementos de sustentação, denotam pouco apuro estilístico, sem uso padronizado do modelo  canjicado e constituintes de simples pedra de mão. No muramento lateral, em ambos os lados, no térreo da partição do nível 1, há vãos provavelmente  para ventilação ou vigia, no formato de óculo e outro no formato de seteiras . A função de um ou outro está em análise comparativa.

Digno de nota é que em nossas pesquisas dentro do escopo da Expedição Lauburu 1 e 2 , registramos o tipo seteira. Conforme pode acessar no link Acesse e conheça a Expedição Lauburu 1

Visão da escada

Reconstituição prévia

Identificação da planta

Versão sem os vãos da frente.
Liberalidade artística.

O frontão , tem dois vãos grandes, um de cada lado da escada, com aproximadamente 3m de largura cada  e ainda uma rústica peça de granito lavrado , no vão da esquerda, se assemelhando a conversadeira ou talvez seja elemento de verga superior desabada.

A escada tem 10 degraus (identificáveis) em pedra lavrada , com 15-20 cm de altura e 1,20-1,50 de comprimento. Possui guarda-corpo cego em pedra .


3.2- Do uso

Coletadas as informações de metria volumétrica, identificadas as metodologias construtivas e os elementos constitutivos , e aplicadas as teorias de movimentação orgânica , é de nossa tese se tratar de uma estrutura comercial de entreposto, sendo parte de uma rede colaborativa regional , com divisões de serviço, tendo em vista o Vale do Sahy e a parte insular, possuírem funcionalidades de estoque , tratamento e dispersão do produto antrópico , ou seja , de mercadoria africana. 

Logo, coadunamos internamente no Instituto com o argumento de uma praça de leilão e revenda.

É nosso parecer prévio. 


Carlos Eduardo da Silva

Prof.Lic.

Angra dos Reis, 02/08/25


quarta-feira, 16 de julho de 2025

EXPOSIÇÃO NA CASA DE CULTURA COM PEÇAS DO MUSEU DE ARTE SACRA INTERDITADO E IGREJAS SEM MANUTENÇÃO

Angra dos Reis-RJ.

1- A exposição do belo:

A exposição entitulada "Abraço da Fé",  tem peças de várias Ordens e Irmandades católicas que em vários séculos desenvolveram seus ritos e confrarias  através da arte dos sentidos da visão.

A parte expositiva está  bem feita, com um funcionário de guia presente para explicar se o visitante quiser imergir nesse mundo de cores, formas e esculturas de um tempo ancestral da fé cristã, com seus santos , heróis do Evangelho e de virtudes.

Iluminação, delimitação para circular o público e até QR Code em cada peça , ajuda na compreensão do material.







2- A exposição do feio e do desleixo:

Porém, é digno de nota que essa mostra, é infelizmente fruto do caos gerado pela urgente transferência do acervo do Convento do Carmo (igreja da Ordem Terceira condenada e a igreja conventual da Ordem Primeira desabada) e também da interdicão pela Defesa Civil da igreja da Ordem Terceira da Penitência , no Convento São Bernardino de Sena, ou seja, o Museu de Arte Sacra ficou abarrotado , sem espaço e pior, o próprio museu foi interditado pela mesma Defesa Civil, pois onde ele fica, a Igreja de Nsa. Sra. da Lapa e Boa Morte, também está em situação precária!

⚜️Acesse e conheça os fatos do abandono recorrente...

🔴Acesse e conheça a situação do Museu é precária há décadas: mesmo reformado em 2025 não é o local adequado para ser o museu.

Assim, o rico, grande e artístico acervo de missas, objetos de prata, de ouro, indumentárias eclesiásticas históricas , esculturas, etc...ficaram espalhadas em diversos espaços da Secretaria de Cultura, num verdadeiro vexame de despreparo, que vem se arrastando há 30 anos, pois como já denunciamos há anos, aquele espaço museal da igreja da Lapa é inadequado para a riqueza e complexidade de artigos antigos ali depositados. 

Mas vale visitar. Está bem agradável.










3- A exposição do tesouro único e especial:

Atenção especial a extraordinária imagem de Nsa. Sra. do Rosário de Mambucaba, tombada /protegida por lei federal ( processo 816-T-1969 Livro do Tombo Belas Artes: Inscr. nº 493, de 11/12/1969), única nessa situação, por ser misteriosa e cercada de atributos simbólicos e origem histórica ainda em pesquisa.




4- A exposição do detalhe: a montagem permite visualizar detalhes artísticos e estilística de época, de cada peça.

Também vale destaque a grandiosa imagem de Sant'Anna, avó de Jesus e em posição de ensino bíblico  (a imagem da Virgem Maria criança certamente adornava o conjunto).






Imaginária em policromia e douramento , sendo do século XVIII, pertencente as alfaias do Convento São Bernardino de Sena, franciscano.

Os três profetas...

Sob a benção e a luz!

A visitação dessa montagem é um privilégio a quem se dispuser.