terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

IGREJA DE NSA.SRA.DOS REMÉDIOS DA RIBEIRA, Angra: DO AFETO DOS POVOS TRADICIONAIS (CAIÇARAS) AO CRIME

 💾📀 ARTIGO 💾📀


REFORMA, CONSTRUÇÃO ILEGAL E MAQUIAGEM?


🏆1- HISTÓRIA

A Igreja de Nsa. Sra. Dos Remédios da Ribeira, próxima ao bairro da Praia do Retiro, Baía da Ribeira, em Angra dos Reis-RJ, é um marco arquitetônico, tanto pelo conjunto bucólico e extraordinário, de ser um templo barroco/rococó a beira mar, quanto por portar talvez, a maior carga de afetividade municipal e de memória dos povos caiçaras de nível regional.

Inaugurada em 1770, dentro do contexto de intenso comércio aurifero e tropeirista,  a Freguesia da Ribeira abarcava um território extenso e sua representatividade simbólica e cartorial, no âmbito da assistência espiritual ia desde a Japuhyba  até o longínquo Frade e Mambucaba, em alguns relatos.

Porém com a compra (envolta em negócios até suspeitos), feitos pelos freis da Ordem Carmelita desde o início dos anos 1900/1920, sobre pressão aos moradores originários e também por doação de outros, as terras foram sendo recebidas, invadidas de espólios e passadas para diversos proprietários no entorno, dentro da perspectiva das explorações e especulações imobiliárias da década de 1960/70 do século XX.

A dinâmica populacional mudou, com vetores de urbanização para o Centro e esvaziamento daquela área...

Houve várias reformas e a última foi em 2008.







🏆2-NOSSA AÇÃO

Porém, desde 2015 que nós, do IPHAR e amigos,  estamos sempre relembrando e cobrando não só a limpeza e identificação tumular do ancestral cemitério, cuja parcela da população original tem entes queridos, mas também a reforma da parte construtiva do templo e principalmente, a abertura com demolição , do acesso a praia, na servidão bicentenária.

Nossa exigência:

Legenda:

🟡Faixa de terrenos privados eclesiásticos (podem cercar, murar, colocar metralhadoras, helicópteros...o que quiserem).

🔴 Servidão histórica, com mais de 250 anos, que tem de ser liberada para acesso ao mar!

🔵Falsa servidão criada para engano da população, fiéis católicos  e turistas. É um terreno privado e está em área de Mata nativa. 

Numa perspectiva interpretativa jurídica nossa,  de que a aplicação do Decreto 6.040/2007, explicitando como território tradicional, "os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais"(Art. 3°, II), fica evidente que a passagem deva ser franqueada. As terras lindeiras ao caminho, ou seja, as que se alega serem privadas da Diocese de Itaguaí (sede episcopal e de CNPJ), podem dispor a seu critério de muros, cercas elétricas, tanques de guerra, caveirões blindados,  exércitos armados, etc...mas apenas nas margens, portanto, fazendo um corredor livre.

Diligência oficial de
agentes federais
 a nosso pedido, 
 constatou ilegalidade d
falsa servidão.






Ainda no arcabouço legal, de forma pétrea, também erguemos a questão do acesso às praias. Contemporaneamente a constituinte de 1988, foi editada a Lei 7.661/88 , cujo dispor instituiu o “Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro - PNGC”, estabelecendo, dentre outros assuntos, normas atinentes ao uso e ocupação da zona costeira.

In limine, devemos levar a efeito o disposto no parágrafo único do artigo 2º do referido diploma legal, cujo dispor determina o conceito jurídico da expressão “Zona Costeira”, in verbis:


Art.2º - (...)


Parágrafo único – Para os efeitos desta lei, considera-se Zona Costeira o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definidas pelo plano.

No intuito de assegurar a preservação do ecossistema marinho, o legislador infraconstitucional incluiu no conceito de “Zona Costeira” as faixas terrestres circunscritas ao perímetro marítimo. Desta feita, restou ampliado e modernizado o conceito em tela, cuja definição anterior afigurava-se retrógrada e sujeita a interpretações equivocadas.

Portão e muro(2014), e agora uma proposta de escada(2021) em falsa e desviada  servidão... são ilegais!

Veja:

Delineado o conceito acima, o artigo 10 do mesmo diploma legal, estabeleceu critérios específicos inerentes ao acesso às praias marítimas, ratificando conceitos anteriormente explicitados conforme se verifica, in verbis:

Art. 10 – As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidos por legislação específica..

§1º- Não será permitida a urbanização ou qualquer forma de utilização do solo na zona costeira que impeça ou dificulte o acesso assegurado no caput deste artigo.(grifo nosso)

Compulsando o disposto na norma supra, depreende-se que todos os cidadãos têm assegurado o direito de acesso às praias brasileiras, acesso este que só poderá ser restringido em virtude de situações excepcionalíssimas contempladas em lei.

Destarte, observa-se não haver qualquer ressalva que excepcione a construção dos indigitados condomínios fechados ou obras impeditivas da liberdade de ir e vir. Pelo contrário, o parágrafo 1º do aludido dispositivo legal veda expressamente qualquer forma de urbanização ou de aproveitamento do solo que ofereça óbice para o acesso às praias marítimas.

Logo, evidente a inconstitucionalidade e a ilegalidade destes condomínios que proíbem o acesso de turistas e banhistas às descritas praias, configurando verdadeiro constrangimento ilegal ante ao flagrante desrespeito as normas sob exame.

Por sua vez, alguns doutrinadores defendem à legalidade dos descritos loteamentos fechados à beira-mar e a conseqüente limitação ao acesso às praias marítimas sob o argumento de que se trata de concessão de uso do terreno público a particulares.


Acima, na foto: INEA notificou a obra ilegal, mas só ficou nisso.

Todavia, com propriedade de argumentação ímpar, o ilustre Promotor José Carlos Freitas  rechaça tal afirmação, asseverando que, in verbis:

“Na concessão de direito real de uso de ruas, praças, espaços livres, áreas verdes e institucionais para a formação dos loteamentos fechados, impera o desejo dos moradores na sua utilização privativa, de cunho individual (sossego, segurança e confortos pessoais), contrapondo o interesse privado ao coletivo, porque essas áreas públicas estão vocacionadas ao uso comum do povo. Logo, esta modalidade de concessão não se presta a ser utilizada para os bens de uso comum, que pressupõem a universalidade, a impessoalidade e a gratuidade de uso, sem contraprestação pecuniária ou indenização particular, além do que “ ... o princípio geral que rege a utilização dos bens de uso comum é o de que o uso de um seja transitório e precário, não impedindo o uso dos demais.” (grifo nosso)

O brilhante ensinamento corrobora à tese da inconstitucionalidade e ilegalidade das ditas concessões reais de direito real para a construção de loteamentos fechados à beira-mar. Noutros termos, os bens de uso comum do povo não estão sujeitos à concessão de direito real de uso uma vez que, sua essência constitucional inviabiliza sobremaneira a transferência de domínio (titularidade) para particulares, a qualquer título.


🏆3-A LUTA

🔸Assim, ingressamos legitimamente no Ministério Público Federal, sede em Angra, em 2015 com um grupo de centenas de cidadãos signatários, a despeito inclusive de perseguições pessoais e até atentados, como constam os documentos na 166° Delegacia de Polícia no TC 166-01008/2015, onde nosso automóvel (estacionado na estrada municipal pública!) foi apedrejado e danificado por funcionário do local (temos testemunha), enquanto fazíamos uma singela tomada de fotografia (foto em preto e branco, início deste artigo), mas com esta atitude popular, logramos  êxito com o instauro do Inquérito Civil 1.30.014.000126/2015-25, onde o Ilmo. Sr  Procurador da República solicitou e enviou uma diligência pericial ao local, que constatou a absurda ilegalidade de um portão na servidão histórica e uma falsa nova servidão em um matagal, com pirambeiras, falta de acessibilidade para cadeirantes e idosos e que nada é senão um caminho de águas naturais.



Fotos da diligência 
do MPF


 Em ferreiro de 2021 um vereador, por ignorância ou má fé objetiva (não sabemos ), colocou na pauta da Câmara Municipal uma Indicação ridícula , querendo consagrar o erro e o crime da obstrução ilegal de acesso a servidão pública original, histórica e de 250 anos. Sua Indicação é que a prefeitura faça uma escada na FALSA servidão , que na verdade é só pra desviar o foco, pois essa pseudo servidão não passa de um caminho natural de enxurradas da chuva no meio da Mata Atlântica...ou seja, caso se construa a escadaria, além do povo esquecer o crime do portão na servidão histórica, também vai destruir um trecho de Mata Atlântica nativa. 


Legenda do mapa abaixo(foto):

EXPLICAÇÃO:

🔴 Servidão original

🔵Falsa servidão; na verdade uma picada natural de águas de chuva.

💜 Área do Cemitério e Igreja, do século XVIII (1772).



🏆4-A reforma ou maquiagem?


Conjunto daquele sítio histórico foi tombado, ou seja protegido por lei, pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural), em 1988, no processo E-03/27.970/82.

Teve várias mudanças, mas no ano de 2020 estamos acompanhando a tal "reforma", feita pela Prefeitura, com tomada de fotos (identificadas como dizer "Redmi Note 8T") constatada na publicação do link https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=594660618124852&id=100027427566339.

Pelas fotografias, se observa um cemitério totalmente roçado, sem lápides ou cruzes tumulares. Também se vê um operário na nave interna do prédio, caiando ou colocando massa corrida.





Se indaga:

🔸Houve reforço estrutural do tesouramento do telhado?Das muralhas da Capela mor  e da sacristia que estão rachadas?

🔸Houve limpeza e reforço das calhas ou implantação das mesmas, no telhado?

🔸A prefeitura limpa um imóvel privado(Igreja Católica) com dinheiro público, mas não cumpre suas próprias ordens de demolição e embargo legal do criminoso fechamento e cerceamento ao acesso público a praia e mar e ao cemitério bicentenário?

🔸Que historiador, arqueologo ou arquiteto está acompanhando,desde a licitação ou tomada de preços ?

🔸Qual o número da Autorização ou documento equivalente expedido a Prefeitura, pelo INEPAC?

🔸Qual estudo estrutural (engenharia)há da situação atual,devido a 12 anos sem reforma?

🔸Qual projeto turístico- pedagógico de visitação pública será implantado(pois só assim se justifica verba pública em em particular da Igreja Católica).

🔸E a identificação tumular, como ficou? Pois há questões legais de registro cadavérico e também da memória historico-afetiva.


Limpeza não é reforma.

Servidão falsa é desvio e crime ambiental.

🔴 Atualização: em 12/03/21 em visita ao MPF obtivemos a informação vitoriosa que este órgão federal transformou IC1.30.014.000126/2015-25 em ACP (Ação Civil Pública), que é um processo judicial do povo e da União contra réus/infratores, desde 12/2018.



Carlos Eduardo da Siva

Prof.Lic. Hi.

Presidente do IPHAR

4 comentários:

  1. Infelizmente se não fizerem nada, vai ser mais um patrimônio histórico de 250 anos virando ruínas, como o São Bernardino de Sena, e tantos outros.

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    1. Verdade.
      Então cada um que lê esse texto, entre no site do MPF e denuncie.

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AGRADEÇO PELA CONTRIBUIÇÃO!
AGORA VOCÊ É UM CAIÇARA!