quarta-feira, 28 de julho de 2021

EXPEDIÇÃO TÉCNICA LAUBURU, 2° parte.


 A nova etapa da Expedição Lauburu, na Serra do Matoso e Serra da Calçada, entre Itaguaí e Pirahy, se fez no dia 25 de julho. 

Essa vez foi mais técnica para coletarmos amostras das rochas, visitação in loco, fotografia historiográfica e análise topográfica. Nossa base foi novamente a Faz. Santa Thereza.


1- Trilha e observação macro

Visitamos o Mirante do Imperador, um tipo de promontório granítico formado por duas plataformas naturais ligadas por uma faixa de pedra, a aproximadamente 628m de altitude.

Belíssima sensação do alto!

Com uma trilha que inicia no Caminho da Calçada/Prezidencia (séc. XIX), onde analisamos uma visão aérea do traçado do Caminho e construção de tese sobre o sítio arqueológico da Casa da Rainha.




Adobe

Identificamos durante a incursão pelo Caminho histórico, logo após a Pedra de Santo Antônio, uma grave erosão do piso histórico com desprendimento  das rochas encaixadas e sedimentos, do calçamento antigo. Foi provocado pela limpeza pesada de arraste de raízes e árvores e trânsito pesado dos tratores da Prefeitura Municipal de Itaguaí, que está implantando o Parque Municipal Natural da Serra da Calçada com placas de locação turísticas. 

Uma valeta transversal para desvio do fluxo lixiviante é urgente. O prezado empreendedor local Álvaro(Fazenda Santa Thereza) já informou as autoridades. A Estrada tem 6m de largura.

A visão macro a partir do Mirante, do traçado do Caminho e das escarpas da mata onbrofila foi importante.



Acesso ao Mirante

A grande baixada de Santa Cruz,
relatada pelos viajantes.

Belíssima vista




https://www.researchgate.net/publication/269565584_
Morfoanatomia_e_ontogenese_dos_frutos_e_sementes
_de_Clusia_lanceolata_CambessClusiaceae






2- Tipificação do pavimento histórico

A generalização exercida por alguns autores é prejudicial na averiguação científica dos Caminhos antigos, porque confunde os leitores. Não é fôrma "pé de moleque". Salvo trechos soterrados por desbarrancamentos ou vegetação grossa, até o momento nossa catalogação evidenciou uma mescla de técnicas , com basicamente dois pisos formando um só, híbrido que denominaremos : moltrana
Uma mistura Moldura + Capistrana.


Esse desenhos acima são parte de nossos Estudos internos, no grupo IPHAR. Inéditos!Eu tive de criar, pois há pouca literatura a respeito.
Aplicando as duas principais formas de montagem , temos o estrado regular, com pedras lavradas na extremidades nos dois lados e uma faixa-guia central como amarração contra o movimento de massa.


Tendo como base nossos Estudos do 2° trecho do Caramujo, em Villela, na Serra D'água, Angra dos Reis-RJ, em 2018,essas peças rochosas tinham um certo padrão na extração das jazidas, no quesito volume/profundidade, com função de boa aderência e estabilidade.


A erosão deixou apenas uma faixa(um lado )da pista.

Durante a Expedição Villela, uma erosão natural revelou a espessura de uma das lajes graníticas: 
19cm, inclusive com a marca do orifício para colocar o bastão de dinamite. Importa ressaltar que esse explosivo foi inventado oficialmente em 1860, portanto, já na segunda metade do século XIX.





A terceira modalidade arquitetônica é enxaimel, um estilo de amarração de solo bem mais elaborado e também presente no cume da Serra da Calçada, e onde está um posto de treinamento do Batalhão de Operações Especiais(BOPE-RJ). 
Teoricamente  seria tática para evitar os sulcos profundos criados pela fricção constante dos cascos ferrados das tropas de muares, caravanas e boiadas por décadas. Esses grupos chegavam a 500 cabeças!


Enxaimel: técnica de preenchimento


3- Análise cartográfica preliminar 

Inicialmente retrocedemos ao século XVIII, com base no mapa de Vieira Leão, de 1767, descritivo das estradas oficiais até então catalogadas, com citação de Guardas, Registros e vilarejos Reais que tivessem o decreto imperial ou cartórios de Freguesias. 


Legenda:

Mapa de Vieira Leão, 1767

Estou publicando uma análise da nossa mapoteca, e coloquei como publicação do DEACCQI(Depto. de Antropologia das Comunidades Caiçara, Quilombola e Indígena),  porque vai precisar de ajuda dos moradores e nativos, para identificar detalhes geográficos.
Já estou apurando...

A-🟣🟢🔵
Partes que marcam a Vila de Tagoay, o Registro(verde)e o entroncamento de dois caminhos(azul)

B-🟢🟢Duas Guardas

C- Apresentação do mapa e autor.

Estamos analisando outros documentos.


4- Prospecção do Sítio Arqueológico "Casa da Rainha"

No período vespertino, implementamos o acesso ao sítio com roçada manual para delimitação. 

Acha que vida de historiador e arqueologo é apenas bibliotecando, como aliás a maioria desses historiadores de gabinete são mesmo...?

Não pudemos avançar devido a presença de Polybia sericea . Assim, retornaremos para metragem de repartições e seus usos do perímetro.

Porém, foi possível a medição das 3 peças,a fotografia historiográfica e o desenho de reconstituição em perspectiva.

A vistoria do espaço inicialmente evidenciou uma área construtiva de 250m², sendo uma terraça medindo frontalmente para o calçamento 25m, 10m de  profundidade e no ponto mais alto, com fundos do muro de arrimo para um riacho, de aprox. 8m de altura.

No paramento externo não identificamos barbacãs, porém, por ser um contraforte natural em um vale aluvião , seria provável existirem esses elementos.



A estrutura de engenharia usada foi o modelo cangicado em pedra seca.

https://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2010/09/06/tecnicas-construtivas-do-periodo-colonial-i/


4.1- Degraus misteriosos

Na locação do sítio, há 3 peças teoricamente pertencentes a estrutura geral. Considerando isso, pontuei algumas questões, baseadas na comparação com a escadaria lateral da sede da Fazenda Santa Thereza:

Este resquício de escadaria consiste em 3 degraus separados , mas próximos.


Na verdade, preliminarmente, estamos publicando a forma de cantaria usada(trabalho de lavrar a pedra).

🔸Poderiam ser do mesmo autor ou escola estilística?

🔸Poderiam pertencer a mesma propriedade , circuito, ou proprietário?

🔸Poderiam ser contemporâneos?
Obs: a locação das 3 peças fica a aproximadamente 0,720 km2 de distância da escada lateral da fazenda em linha reta.
 In loco fizemos a tipificação geológica e o estado de sedimentação/desgaste comparativo.

A primeira indagação tem de levar em consideração que os serviços de cantaria eram custosos e especializados, portanto caso a reforma da sede da fazenda seja contemporânea a construção estudada, é uma possibilidade de ser o mesmo artífice.

Ilustração do arquiteto Gil Fonseca


Nosso estudo via amostragem simples  de ambas as escadas(Fazenda e Sítio) pareceu ser a rocha   da mesma origem geológica. 
Contudo, a escadaria sediada na Santa Thereza tem claramente enxerto de partes exógenas.

Embora embaçada, a escala arqueológica usada
foi de 4cm em todas as medições.

O degrau maior mediu 1,45m de comprimento, mas com fuga de partes nas extremidades, não é certamente a metragem original.

Nesse desenho de reconstituição,
do amigo Gil Fonseca, colocamos em perspectiva
o provável uso do sítio arqueológico.

Foi feita uma descoberta espetacular!


4.2- Descoberta:as lajotas originais

 Durante a prospecção , sob as folhagens,gramíneas,terra e sedimentos conseguimos visualizar o estrado de cerâmica vermelha original.

Sob essas lajotas, fixada, tem uma argamassa de caieira com um aglutinante  amarelado e areia.



As lajotas tem 32cm x 26cm e 7cm de espessura.

O material é uma semi cerâmica de argila comum , do tipo adobe, inteiriça.

Informação: a outra peça já estava partida.


Mary Graham, inglesa, publicou que visitando a Bahia: 

"(...) as melhores casas são  tôdas feitas...onde o chão não é calçado de madeira, há um belo tijolo vermelho, de seis por nove polegadas e três de grossura ; são cobertas com telhas vermelhas redonda."

(Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada entre 1821,1822 e 1823)

Essa descrição feita pela historiadora, desenhista e pintora britânica, se coaduna muito proximamente com as medidas que tomamos  do piso cerâmico encontrado.



5- Epílogo

A Expedição Lauburu continuará as visitas e registros.

Ainda estaremos fazendo tomadas de fotografias e levantamento topográfico das paragens onde haja ruínas ou nomes com ligação histórica.

As rotas tropeiristas são interligadas e tinham sempre , nas oficiais (coloniais/ imperiais), uma infraestrutura muito parecida com intenções de : fisco, de vigilância e de apoio logístico.

É nesse tripé que nos apoiamos!

Arrelá!


Carlos Eduardo da Silva

Prof. Lic. His.












2 comentários:

AGRADEÇO PELA CONTRIBUIÇÃO!
AGORA VOCÊ É UM CAIÇARA!