Uma viagem no tempo!
A Expedição Teolifo-Jorgen percorreu aproximadamente 28 km, entre a estrada férrea e uma pequena parte da estrada de rodagem do bairro Pontal.
1- Resumo histórico
O projeto de expansão da então EFOM (Estrada de Ferro Oeste de Minas) , conhecido como SR-2, teve início ainda no século XIX, mais exatamente em abril de 1893, com a assinatura do contrato de concessão.
Contrução em estilo germânico, com telhado frontal rebaixado. |
Somente em 1910 chegaria ao povoado de Capivary (atual distrito de Lídice), pertencente a Rio Claro. Simplesmente após 10 anos, a obra se ergueu pelo planalto de 8 km até os 593m de altitude, inaugurando a icônica Estação Alto da Serra.
Meus avós Antônio Telmo de Oliveira (Vô Tonico) e Maria do Carmo de Oliveira (Vó Carminha) e tios ainda jovens, iam a pé desde o Alto da Serra e do Rio das Pedras até essa estação para irem a Angra dos Reis.
Trajes típicos do século XIX reconstituídos por nós, faz parte do trabalho de resgate cultural. |
Ali havia expedição de correspondências e malas, restaurante e dormitórios. Uma característica curiosa, é o banheiro externo, típica casinha, que até hoje se encontra de pé...
A excelsa missão de abertura de cortes de morros, levantar grandes terraças, pontilhões em arcos romanos e montar viadutos de aço armado, além da implantação do telégrafo a posteriori, significou o esforço humano mais árduo no contexto de pouca tecnologia e quase nenhum acesso motorizado pelas montanhas e penhascos com alturas que alcançam entre um leito de ponte ao outro lado, de até 20-25m de altura de vão!
O uso de dinamite, carroças e o papel do apoio tropeirista, com mulas e cavalos, foi fundamental.
Em 1928, chegava então a última etapa da implantação ferroviária na Praia do Anil, em Angra dos Reis.
Locomotiva chegando no porto em Angra dos Reis-RJ. Ao fundo, o Convento da Ordem do Carmo. |
2-Percorrendo quase 30 km !
A situação é de total retomada da natureza e da biota da Mata Atlântica sobre a mega estrutura.
Iniciamos no viaduto sobre a RJ155 (-22.843918,-44.209397) e partimos com a equipe formada por um arquiteto, um historiador, um ex secretário de Meio Ambiente , estudantes e outros profissionais. Estava fazendo 16°C aprox. e era 8:00h.
Passando pelo cruzamento da estrada de terra, que corta a ferrovia e liga a empresa de granja Rica, chegamos ao Km 40 da ferrovia, onde se verifica a invasão do leito ferroviário e o loteamento ilegal das margens, por barracos claramente com fins especulatórios, inclusive na década de 1990 e depois em 2018, quando passei nesse trecho, é chocante a diferença de devastação florestal...agora avançando com desmatamento e queimadas após os trilhos, ou seja, acima da ferrovia.
Vale do Alto da Serra: totalmente degradado. |
A Estação Alto da Serra (no Km 37), encontra-se sem vegetação, mas com muitos detritos dentro e o telhamento colapsando...com falhas de cobertura em vários trechos.
Encontramos mais de dez cavaleiros e amazonas dentro do túnel próximo da Estação Alto da Serra, vinham do bairro Serra D'água, revivendo os tempos que meu bisavô Sr. Evergisto , Seu Gito, como arrieiro de tropas de muares, percorria, no início do século XX...
Trajeto |
Seguimos a caminhada, atravessando pontes armadas com seus caibros enormes de décadas, com vistas e panorâmicas da Bacia do Jurumirim e com visão sempre onipresente do Pico do Frade.
O local conhecido como Mirante do Chuveirinho (-22.908278,-44.256350...?), apresenta deslocamento de partes do paredão/laje rochosa , com grandes lascas que caíram sobre o trilho, demonstrando instabilidade do paredão, além de arbustos , gramíneas e árvores de médio porte sobre a linha. Os trilhos continuam lá e o parapeito de metal também.
Atravessamos vários pontilhões , que aparentemente desde 2018, em nossa última visita, sofreram poucos desgastes estruturais, porém há deslizamentos e charques diversos em vários trechos, principalmente nos cortes de morros originais.
A parte de infraestrutura hidráulica, portanto das obras de arte para escoamento tanto fluvial quanto para águas pluviais, continuam funcionais, ainda que algumas caixas coletoras estejam obviamente assoreadas e uma ou outra, já com sinais de inundações sazonais, com sulcos profundos e deslocamento de dormentes.
A beleza cênica do percurso é apaixonante!
São vales profundos que se abrem nos trechos de pontes suspensas, cantos de pássaros , recantos com corredeiras vertiginosas que descem refrescantes e vão alimentar o Vale das Águas Lindas, o Vale da Fazendinha e enfim, o grande rio Jurumirim, além de em alguns locais do percurso, terem crescido espécimes que formam verdadeiros jardins, como o mar de samambaias de solo (Blechnum brasiliensis) e os bambuzais (Bambusa vulgarisvittata) .
O grupo já extenuado, passou por mais de 2h por trechos fechados e escuros, dando sensação de abafamento, na altura do trevo BR 101 até o Pontal, um trecho perigoso, principalmente na travessia dos vãos elevados(pontilhões) , devido ao necessário equilíbrio físico e psicológico.
Capela do bairro Pontal: região do início e fim da Expedição. |
Também recomenda-se o uso de calça comprida de tactel ou poliamida extensíveis e flexíveis e camisas de manga longa, principalmente por causa dos espinhos do morango silvestre (Rufus rosaefolius) e do arranha-gato (Acácia plumosa), além de mosquitos e da presença de carrapatos.
3-O nome da aventura
A Expedição Teolifo- Jorgen carrega um nome muito simbólico: é o nome composto formado pelas identidades dos dois engenheiros que assinaram as obras monumentais que marcaram a construção da ferrovia EFOM(Estrada de Ferro Oeste Minas), no trecho Lídice (então Capivari) x Angra dos Reis, do período 1910-1921.
Os responsáveis técnicos pela odisseia da façanha de singrar as escarpas graníticas da Serra D'água e construir túneis sob montanhas foram , respectivamente , no 1° trecho (Rio Claro x Alto da Serra/1910), Teolifo Monteiro Carvalho e o dinamarquês Gorjen Radmus Peterson, 2° trecho(Alto da Serra x Angra dos Reis/1921).
Porém, também lembramos os pioneiros mais heróicos,que foi a equipe de topografia , esses sim, os primeiros a percorrer a mata ombrofila densa ainda selvagem, em meio a abismos, onças e cobras venenosas...para traçar as coordenadas.
Além deles, os trabalhadores braçais e operários de explosivos, que ficavam pendurados em plataformas de madeira e suspensos por cordas...
Amostra de elemento constitutivo/fixador (Não foi removido; já estava solto na mata) |
4-Epílogo
Chegamos no Pontal. Ali, com uma picada já bem marcada, descemos uma antiga estrada de acesso as torres de alta tensão e depois o sertão do Pontal, certos de que embora cansados, revivemos apenas algumas horas da grandiosa ferrovia centenária!