sábado, 29 de janeiro de 2022

SR. JOÃO GAÚCHO:O ÚLTIMO ARTÍFICE EM PEDRA

"A casa do metalúrgico não e de ferro"

Hoje estive visitando amigos na Várzea do Inhame, Distrito de Lídice,  Rio Claro/RJ.

Fiquei horas conversando com o sr. João Conceição dos Santos, o Seu João Gaucho. Um grande profissional ferreiro e construtor de alvenaria em rocha, com centenas de obras em Angra principalmente, em muros, casas e pier, por décadas.

Entre um assunto e outro , foi me mostrando as ponteiras, a bigorna, as tenazes, o martelo e a forja com a manivela de aeração. 

Explicou que aprendeu  ainda jovem, vendo os antigos, na região do Vale do Parahyba fluminense, mas foi a necessidade que o impulsionou, pois

 " quando você tem o almoço mas não sabe se terá a janta, você trabalha e aprende um ofício". Assim, acabamos analisando antropologicamente a relação trabalho x  prazer , mais precisamente o termo latino tripalium, objeto de três pontas que batia o trigo, o linho e o milho, para debulha ou esfiapar, simbolo da fadiga, no período medieval europeu. Indiretamente, filosofamos sobre o conceito rosseauneano das virtudes naturais .

Forja

Ali discorremos sobre a beleza das múltiplas profissões e  a função na História de cada uma, desde a Idade do Ferro (+- 3 mil anos). A montagem de estradas, muros de cantaria e cangicados  tem muita antiguidade, vinda do sec. XVII ao XIX, mas com raízes tanto européias quanto indígenas americanas.


Cangicado: https://www.google.com/amp/s/
coisasdaarquitetura.wordpress.com
/2010/09/06/
tecnicas-construtivas-do-periodo-colonial-i/amp/

Porem, indiscutível a africanidade presente, ainda mais na resiliência do sr. João,  pois o aquele continente sempre teve a arte escultórica , vide as extraordinárias igrejas de pedra pura, cavadas na montanha, do Rei Lalibela, do seculo 12, na Ethiopia.

Ethiopia


Sobre as argamassas, ele explicou que raramente usavam, pois o cálculo (empírico) da massa/peso da peça rochosa fazia que ela não se deslocasse com ondas do mar, enxurradas ou movimentos naturais do terreno; mas necessitando, era uma mistura de areia e argila. Sobre o uso de prumo, a própria estrutura do gnaisse e do granito traz dificuldades, devido a superfície irregular, portanto, era a expertise deles que fazia a quase perfeição das estruturas, com as diferenças passando quase imperceptíveis aos clientes.


Pedreira de gnaisse:Jean-Baptiste Debret, 1834-39

O sr. João conheceu meus avós, seu Tonico  (Antonio Telmo) e dona Carminha (Maria do Carmo de Oliveira) e meus bisavós , dona Ana e Seu Gito  (Hermergisto). Grandes memórias!

Obviamente que hoje tem tecnologias de corte , outros profissionais da construção civil também fazendo muros, com tecnologias diversas, softwares etc, mas o pioneirismo e os macetes deste grande artífice, presentes ali, vivos, são honoráveis... são indeléveis, são únicos.


Tenazes

No olhar desse ancião, tem a história viva da região e das relações sociais , num semblante de simpatia e profundidade...cheio de ancestralidade. 

Um salve ao Seu João!

Um comentário:

AGRADEÇO PELA CONTRIBUIÇÃO!
AGORA VOCÊ É UM CAIÇARA!